INTRODUÇÃO
Ângela se irritou quando, ante toda aquela paisagem paradisíaca, avistou uma garrafa afundada na areia. Era uma tarde de março, quando o calor e a brisa se juntam para anunciar que o outono já se aproxima e logo vai esfriar em todo o litoral paulista.
Chovera na noite anterior e agora ela se lembrava da canção de Tom Jobim, que entoara em duo com Tatiana: “...são as águas de março, fechando o verão... É pau é pedra, é o fim do caminho!” Essa canção as tinha ajudado a decidir adiar noite a viagem, com medo de que caíssem árvores pelo caminho ou que a chuva tornasse o trajeto perigoso.
Tinham pego a estrada pela manhã, já sem chuva. Agora, caminhando pela praia, ainda podia visualizar o efeito da chuva na região. Muitas folhas ainda verdes se misturavam com as já amareladas e marrons, trazidas pelo mar agitado, formando na areia um mosaico multicolorido que, felizmente, estava pouco salpicado de objetos que não fossem orgânicos, arrumados ali pela própria natureza.
Talvez tenha sido pelo fato de haver poucos detritos poluentes na praia que seus olhos ficaram alerta àquele ponto específico. Em outra praia mais poluída provavelmente a garrafa não lhe chamasse a atenção.
_ Não adianta! _ resmungou para si mesma _ Por mais que tentemos conscientizar, há pessoas que continuam atirando lixo na praia.
Surpreendeu-se ao ver que a garrafa estava completamente vedada com uma rolha atada ao gargalo por uma cordinha e o que pareceu alguma resina vedando completamente a boca. Ao levantá-la viu que havia um papel dentro, cuidadosamente atado com uma fitinha vermelha. A corda amarrada à rolha também estava delicadamente trabalhada com nós de macramê.
“Um náufrago?”
Imediatamente se arrependeu desse pensamento idiota, pois um náufrago, muito provavelmente, não teria recursos para vedar a garrafa daquela forma, atar sua carta com uma fita vermelha, vedar a rolha com resina ou mesmo dar nós de macramê para enfeitar sua mensagem de salvação.
Tentou abrir a garrafa ali mesmo, mas ficou evidente que necessitaria alguma ferramenta para a tarefa. Dirigiu-se à casa de Tatiana e, depois de pegar um saca-rolhas e uma faca, se meteu no quarto e cortou o dedo antes mesmo de conseguir chegar até a rolha.
“Quando você vai aprender a controlar a ansiedade?” Perguntou-se.
Respirou fundo, se sentou na borda da cama com a garrafa na mão direita. Meteu o dedo indicador da mão esquerda na boca, para chupar o sangue, e se dedicou à tarefa pacientemente.
Removeu a resina, cortou a cordinha e pegou o saca-rolhas.
A cortiça esfarelou quando tentou arrancá-la da boca da garrafa. Empurrou-a para dentro e pensou que tinha o caminho livre para o papel meio enrolado que parecia querer revelar-lhe um grande segredo.
Mas a tarefa não foi assim tão fácil, já que não conseguia tocar com o dedo no papel, para puxá-lo para fora, e o rolo era mais grosso que a abertura na boca da garrafa.
Depois de pensar por alguns instantes, se lembrou de um prendedor de cabelo, em formato de agulha de tricô, feito de bambu, que trazia na mala.
Usou a faca para partir a ponta do prendedor em duas, formando uma espécie de pinça, que introduziu pela boca da garrafa. Com essa pinça prendeu uma ponta da folha de papel e a enrolou, para que seu diâmetro diminuísse e passasse, finalmente, pelo gargalo.
O que estava escrito no papel mudaria sua vida para sempre!
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